ATA DA VIGÉSIMA SÉTIMA SESSÃO SOLENE DA SEXTA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA NONA LEGISLATURA, EM 16.06.1988.

 

 

Aos dezesseis dias do mês de junho do ano de mil novecentos e oitenta e oito reuniu-se, na Sala de sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Vigésima Sétima Sessão Solene da Sexta Sessão Legislativa Ordinária da Nona Legislatura, destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito ao Professor Ernani Maria Fiori, “In Memorian”, concedido através do Projeto de Resolução n.º 47/84 (Proc. N.º 2137/84). Às vinte horas e vinte e seis minutos, constatada a existência de “quorum”, a Sr.ª Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a MESA: Verª Gladis Mantelli, 1ª Secretária da Câmara Municipal de Porto Alegre, no exercício da Presidência, neste ato; Arq. Roque Geraldo Fiori, filho do Homenageado; Prof. Joaquim José Felizardo, Secretário Municipal de Cultura, representando, neste ato, o Sr. Pref. Municipal, Dr. Alceu Collares; Ver. André Cecil Forster, Diretor-Superintendente da Metroplan; Dr. Renato D’Arrigo, Diretor-Presidente da Companhia Carris Porto-Alegrense; Dr. Manoel André da Rocha, Procurador Geral do Estado; Ver. Flávio Coulon, Secretário “ad hoc”. A seguir, a Verª Gladis Mantelli passou a direção dos trabalhos ao Ver. André Cecil Forster. Em continuidade, a Verª Gladis Mantelli, em nome das Bancadas do PMDB, PDS, PDT e PFL, declarou que a proposição da presente Sessão é de autoria do Ver. André Cecil Forster, que atualmente encontra-se na direção da Metroplan. Discorreu sobre a vida do Prof. Ernani Maria Fiori, falando de sua personalidade de homem que lutou por uma conscientização da realidade de seu País e que sempre buscou um ideal de democracia e liberdade para o Brasil. Após, a Verª Gladis Mantelli reassumiu a presidência dos trabalhos e convidou o Ver. André Cecil Forster a proceder à entrega do título honorífico de Cidadão Emérito do Prof. Ernani Maria Fiori ao Arq. Roque Geraldo Fiori, filho de S. Sa. Dando prosseguimento, a Sra. Presidente procedeu à entrega do Troféu “Frade de Pedra”, o qual também foi recebido pelo Arq. Roque Geraldo Fiori. A seguir, a Sra. Presidente concedeu a palavra ao Arq. Roque Geraldo Fiori, que agradeceu a homenagem prestada pela Casa a seu pai. Após, a Sr.ª Presidente fez pronunciamento alusivo à solenidade, convidou as autoridades e personalidades presentes a passarem à Sala de Presidência e, nada mais havendo a tratar, levantou os trabalhos às vinte horas e quarenta e cinco minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pela Verª Gladis Mantelli e secretariados pelo Ver. Flávio Coulon. Do que eu, Flávio Coulon, Secretário “ad hoc”, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Srs. Presidente e 1ª Secretária.

 

 

A SRA. PRESIDENTE: Antes de iniciarmos os procedimentos normais de tramitação desta Casa, eu gostaria de colocar que esta Sessão Solene está sendo solicitada por meu intermédio na medida em que o Ver. André Forster, que seria quem de direito deveria solicitá-la, e como é do conhecimento de todos, encontra-se afastado do exercício desta Casa e, portanto, regimentalmente, não pode fazê-lo. Mas, de qualquer maneira, foi um prazer que o fizesse para que eu pudesse ser, na oportunidade, dentre tantos companheiros de Bancada, a pessoa que teve iniciativa de solicitar esta homenagem. Eu falarei em nome de toda a Casa, em nome das Bancadas do PMDB, do PDS, do PDT, do PFL e do PCB, na medida em que os Vereadores líderes das diversas Bancadas desta Casa me designaram para tal. Para evitar de fazer o meu discurso desta tribuna que, no momento, estou ocupando como Presidente dos trabalhos, solicitaria, mesmo anti-regimentalmente, que o Ver. André Forster me substituísse na Presidência dos trabalhos.

 

(O Sr. André Forster assume a Presidência dos trabalhos.)

 

O SR. PRESIDENTE: A palavra com a Verª Gladis Mantelli.

 

A SRA. GLADIS MANTELLI: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, sentimo-nos gratificados ao propor esta solenidade de outorga do título de Cidadão Emérito de Porto Alegre, por indicação do ilustre Vereador André Forster. Porém, nos sentimos pesarosos pelas inexoráveis leis da vida, que impedem a presença do Professor Fiori.

A grandeza de um homem se dimensiona no seu caráter e nas suas obras.

Ernani Maria Fiori. Um homem que buscou viver a verdade em um tempo de mentiras, que comungou a justiça quando era injustiçado, que respeitou o ser humano sem ser respeitado como tal.

Foi um grande mestre, que fez da cátedra seu instrumento de luta para que este País fosse livre e democrático a fim de que nossa gente tivesse a sua dignidade restabelecida. Isto tudo quando vivíamos a face mais cruel do arbítrio. Quando a força do direito foi substituía pelo direito da força.

Pessoa fraterna, educador brilhante, intelectual ímpar, o Prof. Fiori foi um entrave, uma perturbação para o regime que golpeando as instituições, se instalou pela força no País em 1964.

Foi um entrave justamente porque representa a consciência crítica do seu povo que não aceitava ser submetido a uma ditadura totalmente ilegítima.

Foi uma perturbação porque continuou sua luta pelas liberdades democráticas subtraídas à Nação.

O eminente humanista, consagrado inclusive no exterior, nunca se calou ante as pressões, nem mesmo poupou esforços para que seus alunos tivessem uma visão crítica do que corria. Que se questionassem sobre povo, nação, governo, homem, legitimidade, verdade - tema que sem dúvida incomodava a quem busca o exercício do poder pela força.

Aos regimes de exceção, o principal inimigo é a educação que leva o cidadão a refletir e questionar a sua realidade, não aceitando, passivamente, imposições espúrias.

Cassado, perseguido, o Professor Fiori nunca cessou a caminhada. Em momento algum acovardou-se. Sua causa era a causa do povo brasileiro na sua luta por democracia e liberdade. Seu ideal era maior do que os obstáculos interpostos.

Ernani Maria Fiori tinha a marca do líder. Liderança essa exercitada ainda nos bancos escolares, quando participava das lutas acadêmicas em que defrontavam grupos de orientações ideológicas opostas.

As Casas de Juventude Universitária Católica, que hoje infelizmente estão reduzidas a um número muito pequeno e quase abandonadas pelo poder público, tiveram em Ernani Fiori um dos seus fundadores e posterior incentivador.

A sua preocupação com a classe operária era tanta que o levou a divulgar e colaborar com o movimento dos círculos operários em todo o Rio Grande do Sul. Tendo ainda utilizado os espaços que lhe eram oportunizados como jornalista e escritor para dar ênfase aos temas de conteúdo social, especialmente os da classe operária.

Seus ensinamentos e sua visão do mundo foram divulgados através da docência nas principais universidades do nosso Estado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Pontifícia Universidade Católica, deixando um legado de competência e realizações, em especial a criação do Instituto de Filosofia da UFRGS.

Tendo sido proibido de lecionar nestas universidades, o Professor Fiori acredita poder ainda contribuir com seus ensinamentos na Universidade de Brasília considerada na época uma instituição mais aberta, e lá também não o pouparam.

Mas, se não podia ser educador em seu próprio País, vai para o exterior. O importante é que sua mensagem não parasse.

A família foi para Ernani Fiori, um conforto e um estímulo em todos os momentos. Dona Hilda e seus filhos inspiraram suas lutas e fortaleceram seu ideal.

Fiori morreu lutando por um mundo melhor, uma pátria feliz, um futuro sem medo. Mas a sua luta ainda continua, pois homens como ele não são vencidos pela morte que não sufoca seus ideais e seu trabalho. A chama de suas idéias continua acesa e se constitui no farol que ilumina o caminho daqueles que, como ele, peregrinam em busca da liberdade.

A Câmara Municipal de Porto Alegre cumpriu o seu papel.

A solenidade de hoje é simbólica, pois quando entregamos ao Doutor Roque Fiori, seu filho, esta outorga, estamos apenas registrando na história desta Casa a homenagem que já lhe foi prestada em vida ao ser proposto pelo Ver. André Forster e aprovado pelos parlamentares da Câmara Municipal o título de Cidadão Emérito.

Porto Alegre resgata uma dívida de gratidão com um dos seus mais bravos e ilustres filhos, embora sabendo que jamais será possível recuperar do seu convívio e de seus ensinamentos.

 

A SRA. PRESIDENTE: Irei quebrar o protocolo mais uma vez e solicitaria ao Ver. André Forster para que faça a entrega do Título de Cidadão Emérito ao filho do Professor Ernani Maria Fiori, o Arquiteto que hoje representa seus filhos aqui nesta solenidade. Nosso arquiteto Roque Fiori. Eu pediria que, de pé, fosse assistida a entrega do título.

(O Sr. André Forster procede à entrega do título. Palmas.)

 

A SRA. PRESIDENTE: A Câmara também instituiu um troféu chamado Troféu Frade de Pedra, que traduz o apreço da população porto-alegrense a todas as pessoas que, de alguma forma, prestaram serviços à comunidade. Historicamente, ele traduz a hospitalidade rio-grandense, uma vez que representa o símbolo da fraternidade, das boas-vindas. Eu gostaria, então, neste momento, de passar às mãos do Arquiteto Roque o Troféu Frade de Pedra em nome desta Casa.

 

(É feita a entrega do troféu. Palmas.)

 

Concedemos a palavra ao arquiteto Roque Fiori, filho do Prof. Ernani Maria Fiori, para que faça a sua locução.

 

O SR. ROQUE FIORI: Srs. Presidente, Srs. Vereadores, neste momento, venho aqui como representante de minha família e como filho mais velho de Ernani Maria Fiori, falecido em abril de 85, para dizer da emoção que a todos nós atinge, esta homenagem, agora póstuma.

Pouco tempo antes de falecer, foi ele comunicado do título que lhe havia sido outorgado por esta Egrégia Câmara de representantes do povo porto-alegrense, e na impossibilidade de aqui comparecer iniciou a escrever sua mensagem de agradecimento que ficou inconclusa, mas e que neste momento passo a ler:

“Desde o dia em que recebi a comunicação dessa Ilustre Câmara de que me outorgaria o título de “Cidadão Emérito desta Cidade”, aguardei-o com ansiedade. Infelizmente, uma crise de saúde impede-me de estar presente para receber de vossa generosidade meu título, dos que mais honram o meu “curriculum”. Essa minha condição atual não me permite sequer elaborar um discurso que possa corresponder, dignamente, à generosidade dos Srs. Mas não quero deixar de expressar, parcialmente ao menos, minha gratidão, enviando-lhes esta mensagem por meio de meu filho, Roque Geraldo.

Não me surpreendeu que uma Câmara Política escolhesse, não a mim, mas a um Professor de Filosofia, para integrar a plêiade de cidadãos eméritos da Cidade. Em verdade, a relação entre Filosofia e Política é intrínseca. A rigor, não há uma parte da Filosofia dedicada à Política, com exclusão das demais. A Filosofia não pode deixar de ser, por si mesma, Política.

Não é um momento de desenvolver o tema, mas, apenas, uma observação pertinente e básica. Quem afirmou “que os filósofos, até hoje, só tem interpretado o mundo de diversos modos, é necessário agora transformá-lo” não quis dizer que a ação transformadora do mundo deve substituir a ação reflexiva de seu pensamento. É o que ilustra a obra do próprio autor da referida tese.

Interpretação e transformação se integram num só movimento de reconstituição do mundo. Pensar realidade, criticamente, é desvendar as negações que dentro dela se aninham, e fazê-las forças propulsoras de novas culturas e de novos mundos, no sentido de sua permanente humanização.

As idéias filosóficas, isoladamente, não movem a História. Muitas delas, no entanto, ganham força de “práxis” – idéias – força. Como tais, podem integrar ideologias sócio-políticas que marcam o sentido ascensional de certos ciclos históricos, muitas vezes, suas vigas mestras. Em todo trajeto histórico-ideológico, a Filosofia, no plano social, exerce uma eminente ação crítica, no sentido de sofrear utopias abstratas ou de romper os fechamentos ideológicos.”

Mais uma vez, em nome de toda a minha família, muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

A SRA PRESIDENTE: Na oportunidade do encerramento dos trabalhos, compete à Presidência dirigir algumas palavras ao público presente. Como já me pronunciei em duas oportunidades, na abertura da Sessão e em meu discurso em nome da Casa e das Bancadas, não o farei neste momento. Assim, só me resta agradecer a presença de todos. Aqueles que estão aqui, hoje, mantêm muito viva, em sua memória, em seus corações a presença do Professor Ernani Maria Fiori. Agradeço, em especial, a presença do Prof. Joaquim José Felizardo, representado neste ato o Prefeito da Cidade, ao Dr. Manoel André da Rocha, Procurador Geral do Estado; ao Ver. André Forster, Diretor-Superintendente da Metroplan e ao Dr. Renato D’Arrigo, Diretor-Presidente da Cia. Carris Porto-Alegrense.

Agradeço, novamente, a presença de todos e estão encerrados os trabalhos.

 

(Levanta-se a Sessão às 20h45min.)

 

* * * * *